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Implantação de complexo eólico gera dúvidas e expectativas em Mata Grande

Empreendimento no Alto Sertão pretende gerar 280 empregos diretos e cerca de 600 indiretos

Foto: Reprodução

É no município de Mata Grande, no Alto Sertão alagoano, que os ventos sopram favoráveis à produção de uma fonte renovável de energia. E essa condição atraiu olhares para a Serra do Parafuso, um paredão avermelhado, na divisa de Alagoas com Pernambuco, que pode abrigar o primeiro complexo eólico do estado.


Alagoas é o único estado do Nordeste que ainda não possui fonte de energia eólica. Se instalado, o complexo vai contar com quatro parques eólicos, cada um com 10 aerogeradores, totalizando 40 turbinas eólicas (que são grandes equipamentos com a função de transformar a energia dos ventos em energia elétrica).


Segundo o governo de Alagoas, a Casa dos Ventos, empresa que pretende instalar o complexo, demonstrou interesse em executar o investimento e apresentou o projeto para a construção e operação em 2022. A estimativa inicial de investimentos é de R$ 700 milhões. A implantação está em processo de licenciamento ambiental, que conta com três fases: licença prévia, instalação e operação.


Atualmente, o processo está na licença prévia. Segundo o Instituto do Meio Ambiente (IMA) de Alagoas, essa fase deve durar cerca de 60 dias.


O diretor de meio ambiente da Casa dos Ventos, João Vidal, informou que a escolha de Mata Grande para a implantação se deve ao potencial eólico da região. “Primeiro porque tem uma situação geográfica ideal, com boas correntes de vento, tem a disponibilidade de terras e infraestrutura que favorecem a instalação e execução do projeto eólico”.


A Casa dos Ventos Desenvolvimento, empresa responsável pelos estudos ambientais e licenciamento, comunicou que, caso seja autorizado pelos órgãos competentes após a análise do futuro pedido de licença de instalação, o complexo eólico deverá gerar mais de 280 empregos diretos e cerca de 600 indiretos.


AUDIÊNCIA PÚBLICA


Na última quarta-feira (19), uma audiência pública foi realizada pelo IMA, etapa obrigatória no licenciamento ambiental, e contou com a participação de mais de 300 representantes da sociedade civil.


O diretor do Instituto, Ivens Leão, disse que esse é o início do processo e que não há nenhuma autorização emitida para a instalação do complexo. Ele explicou que foi solicitado um EIA/RIMA - o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental -, que foram apresentados pela empresa na ocasião.


EMPREENDIMENTO TEM GERADO DEBATES


Questões envolvendo a consulta prévia às comunidades tradicionais podem atrasar o empreendimento. É o que afirma o Coletivo de Assessoria Cirandas. A crítica é que a iniciativa privada está substituindo o papel do Estado na realização da Consulta Prévia, Livre e Informada.


Segundo eles, a consulta prévia, uma exigência da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) adotada no Brasil há mais de duas décadas, foi conduzida pela empresa responsável pelo projeto, Casa dos Ventos, em vez do governo. O procedimento, conforme a convenção, deve ser uma responsabilidade estatal e realizado antes do início do licenciamento.


João Paulo Diogo, coordenador do Coletivo de Assessoria Cirandas, destaca que, segundo o Ministério Público Federal, é dever do Estado brasileiro consultar adequadamente as comunidades indígenas e tradicionais sobre decisões que impactem suas vidas e direitos. “A consulta deve ser transparente, livre de pressões e capaz de refletir a diversidade dessas populações”, afirma.


A área onde será construído o complexo, também é habitada por povos indígenas kambiwá e tuxá. A Convenção 169 da OIT assegura o direito dessas comunidades de serem consultadas antes de qualquer empreendimento que possa alterar seu modo de vida ou território, podendo até recusar a instalação das turbinas.


Sobre esse questionamento, o IMA confirmou que, quando existem povos tradicionais em áreas onde esse tipo de empreendimento é instalado, é preciso ouvir os órgãos responsáveis. No caso da Serra do Parafuso, onde tem comunidades quilombolas, indígenas e assentados, é preciso do acompanhamento da Fundação Palmares, Funai e Iteral.


Sobre esse assunto, a empresa disse que o contato foi feito com as instituições. Em nota, comunicou que foi amplamente divulgado por meio de publicação em Diário Oficial do Estado, jornais de grande circulação e ofícios enviados com antecedência aos órgãos e fundações interessadas.


Outra dúvida é sobre o impacto ambiental da construção do complexo. Ambientalistas e moradores da região exigem maior transparência no processo. É o caso de Maria Ângela Nascimento dos Santos, da Associação de Mulheres Rurais do Semiárido Alagoano. Ela ressalta a falta de informações sobre os impactos na saúde e no meio ambiente, já observados em outros estados do Nordeste.


“A empresa fala em arrendar as terras, mas não detalha os impactos na saúde das pessoas, nem no meio ambiente, que são coisas comprovadas em outros Estados do Nordeste em que a energia eólica já entrou. Acreditamos no potencial de Alagoas e sabemos que estamos, de alguma forma, levando a energia para aqueles que não têm.


Estamos com a certeza de que juntos construímos um projeto para Alagoas, mas queremos saber, como as famílias vão ficar?”, questiona.


Outra preocupação é com relação a espécies ameaçadas, merecendo especial atenção o macaco-prego-galego. O animal é uma espécie em perigo, que habita fragmentos da Mata Atlântica e Caatinga dos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas.


Sobre a questão ambiental, Ivens Leão falou que esse questionamento foi feito à empresa, inclusive após a audiência, e que ficou definido que ela vai disponibilizar o estudo mais detalhado que traz detalhes sobre a biodiversidade da região. “Esse estudo que está disponível é resumido, por isso a empresa deve apresentar o relatório completo para que seja analisado”, fala.


O secretário de Administração e Planejamento de Mata Grande, José Jyordanny, disse que na audiência pública foi apresentado um estudo que apontou que a região é inabitada e que não tem rios ou riachos. “O Município estará atento junto aos demais órgãos de controle, para buscar benefícios ao meio ambiente e às comunidades envolvidas e possíveis soluções para reduzir ao máximo quaisquer danos”, diz.


Sobre o empreendimento, ele destacou que haverá a elevação em até 30% do IDH e do PIB, além de melhora na arrecadação municipal, que poderá ser revertida em benefícios para a população.


O diretor do IMA reforçou que a implantação ainda está na fase inicial. “Após a audiência, o procedimento é analisar tudo, junto a uma comissão multidisciplinar, composta por especialistas de diversas áreas. Estamos muito atentos às principais temáticas modernas e o diálogo é fundamental. Estaremos sempre abertos a ouvir, de forma qualificada e compromissada”, expõe Leão.

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