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Levantamento mostra água do São Francisco sendo usada por mais que o dobro da população cadastrada

Foram localizadas 2.062 interferências ao longo do rio, sendo a maioria delas - um total de 1.942 - referente à captação de água

Foto: Reprodução/Levantamento foi realizado em trecho do Rio São Francisco

Um levantamento contratado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco apontou para a existência de 2.062 interferências ao longo do rio, sendo a maioria delas - um total de 1.942 - referente à captação de água. O número é mais que o dobro do registrado oficialmente, que é de 850 usuários cadastrados. O levantamento foi feito com o objetivo de identificar, por meio de fotografia aérea de alta resolução e laser scanner, todos os usuários de água ao longo da área localizada entre as usinas de Três Marias e Sobradinho.


No total, foram mais de 600 km percorridos, em trechos que, segundo estudos, registram as maiores retiradas de água e volumes captados anualmente. São eles: trecho 1, entre os municípios mineiros de Três Marias e Ibiaí; trecho 2, entre os municípios de São Francisco, em Minas Gerais, e Carinhanha, na Bahia, e, por fim, o trecho 3, entre Paratinga e Morpará, ambos na Bahia.


A execução da Cobertura Aerofotogramétrica e do Perfilamento a Laser contratados aconteceu de 7 a 23 de outubro de 2020. No total, foram 22.313 fotografias tomadas e 533 faixas de voo. O serviço foi executado ao custo de R$ 1.665.397,60.


Mais captação


Os dados obtidos a partir do mapeamento foram sobrepostos ao banco de dados da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), disponibilizado na plataforma do Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos (SNIRH).


Thiago Campos, da Gerência de Projetos da Agência Peixe vivo (APV), explica que “nesse momento não há como afirmarmos que se tratam de usos clandestinos ou irregulares, uma vez que não foi objetivo desse trabalho avaliar a legalidade dos usos de água e sim identificar a sua localização e compará-los com o banco de dados oficial”.


Ele reforça que o cadastro de usuários de recursos hídricos requer uma atualização periódica: “esse instrumento é de extrema importância para se ter conhecimento de quem, como e onde se faz uso da água.”


Vale frisar que com o resultado do levantamento em mãos, já está na pauta a necessidade de apresentação formal dessas informações perante as autoridades competentes para a fiscalização do uso de recursos hídricos, notoriamente a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). “A nossa expectativa é de que teremos desdobramentos desse trabalho no segundo semestre de 2021, a fim de avaliar possíveis usos irregulares”, conta Thiago Campos.


Gestão e cobrança


O presidente do CBHSF, Anivaldo Miranda, reforça sobre a importância do aerolevantamento para a gestão da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco: “esse trabalho faz parte das ações estruturantes do Comitê. É fundamental saber sobre os usos da água, retiradas e lançamentos de efluentes na calha central do Rio São Francisco e fazer um esforço para incorporá-los ao sistema. Isso está ligado a um dos principais instrumentos de gestão hídrica, que é a cobrança pelo uso da água bruta”.


Ele destaca que a cobrança gera um sentimento de responsabilidade em quem faz captação e contribui para fomentar o tratamento de efluentes. E diz mais: “esses recursos da cobrança são essenciais para a aplicação do Plano de Gestão da Bacia, para fazermos, por meio da nossa agência delegatária, uma série de ações que beneficia o rio, os pagantes e, claro, as populações que interagem com ele, além de toda a sociedade.”


Para que isso avance, é fundamental manter o cadastro atualizado. Anivaldo explica que, tirando os isentos, que ficam abaixo da linha de corte pelo volume captado, não pode haver um conjunto de usuários que paga e outro que não paga. Ele comenta, ainda, que os resultados do aerolevantamento serão encaminhados à ANA, para que façam o que for cabível no que diz respeito à outorga dos usuários não cadastrados, bem como para o Conselho Nacional de Recursos Hídricos e para as secretarias estaduais. A ideia é que todos possam fazer uso desses dados que trazem também ganhos adicionais, por revelar nas imagens outras informações relevantes no contexto ambiental.


É importante destacar que a contratação desse aerolevantamento foi motivada por um achado em 2016, quando a partir de um voo num curto trecho do Baixo São Francisco, identificou-se uma série de usuários não contemplados no SNIRH. Esse experimento, na época, foi realizado pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e acendeu um alerta sobre a existência de possíveis usos não regularizados.


Os achados


No total, foram 2062 interferências encontradas nos três trechos. A maior parte delas, 1942, foram relativas à captação, seguidas pelas de lançamento, com 78 achados.


O trecho 2, que compreende a área de São Francisco, Minas Gerais, e Carinhanha, na Bahia, foi o que apresentou mais interferências: 821, sendo 810 categorizados como captação, abrangendo canais de desvio ou de chamada para a tomada d’água, captação em terra firme e captação flutuante. Outros 11 foram identificados como tubulação ou galerias para lançamento de efluentes, bem como canais de desvio para o mesmo fim.

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